Estudando o Espiritismo

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sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Reflexões sobre o Dia de Finados


Reflexões sobre o Dia de Finados
Christiano Torchi
Qual será a origem da cultura de se consagrar um dia em homenagem aos “mortos”? Qual o significado da palavra “finados”? Será mesmo necessário ir aos cemitérios para honrar a memória dos que retornaram à Pátria Espiritual? E qual a melhor deferência que podemos prestar a eles?
 De acordo com alguns pesquisadores, o dia consagrado aos mortos originou-se dos antigos povos gauleses, os quais, conhecedores da indestrutibilidade do ser, honravam os Espíritos e não os cadáveres como, equivocadamente, se faz na atualidade.
 O culto ao dia dos mortos é uma tradição mundial, cuja origem se perde na noite dos tempos, constituindo, como se lê na resposta à questão 329 de O Livro dos Espíritos (FEB Editora), um forte indício da imortalidade da alma, acalentadaintuitivamente pelo homem.1

 Finado é o particípio passado do verbo “finar”, que significa o indivíduo que morreu, findou, faleceu, termo que se substantivou com a cultura adotada pelos povos das mais diversas religiões, prática essa que esteve muito ligada, na Antiguidade, aos cultosagrários ou da fertilidade: acreditava-se que os mortos, como as sementes, eram enterrados com vistas à ressurreição (novo nascimento).

Em vista disso, o primitivo Dia de Finados era festejado com banquetes e orgias perto dos túmulos, costume disseminado em várias civilizações do passado.

 Consta que, após a morte do tirano Mausolo, rei de Cária, antiga região da Ásia Menor, a esposa do imperador, Artemísia, ordenou a construção de um enorme edifício, ricamente enfeitado, para abrigar o corpo do soberano. Essa construção, ou monumento funerário, é considerada uma das maravilhas do mundo antigo, dentre as quais despontam as pirâmides do Egito, que até hoje constituem morada dos restos mortais dos antigos faraós. Daí teria surgido a palavra “mausoléu” para identificar os sepulcros de grandes proporções.

Entretanto, somente no final do século X é que foi oficializado pela Igreja de Roma o “culto aos mortos”, com o nome de “finados”, destinado especificamente aos Espíritos que estariam no “Purgatório”, lugar, segundo a crença católica, “onde as almas dos que cometeram pecados leves acabam de purgar suas faltas, antes de ir para o paraíso”,* as quais também dependeriam, para serem resgatadas – ainda segundo a crença católica – das preces dos que estão na Terra.**

 Para o Espiritismo, este é um dia como qualquer outro, uma vez que considera a ida ao cemitério como a exteriorização de um sentimento. Os que visitam um túmulo manifestam, por esse costume, que pensam no desencarnado, embora muitos o façam apenas para se desincumbir de mais uma “obrigação social” no calendário humano, sem que haja a exteriorização sincera de amor.

*HOUAISS, Antônio e outros. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. Verbete “purgatório”, p. 1.579.
**KARDEC, Allan. O céu e o inferno. Trad. Manuel Quintão. 60. ed. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2012. Cap. 5, it. 2.

 Para homenagear o ente querido que nos precedeu no retorno ao mundo espiritual, não é preciso, necessariamente, ir a cemitérios, cuja aparência lúgubre geralmente evoca lembranças desagradáveis de corpos perecíveis em decomposição.

 O que sensibiliza o desencarnado não é propriamente a visita à sepultura, mas a lembrança fraterna e a prece sincera daquele que ficou na Terra, o que pode ser feito a qualquer momento e em qualquer lugar. Por isso, o dia de finados não é mais importante, para os que morrem, do que outros dias. A diferença entre o dia de finados e as demais datas é que, naquele, mais pessoas invocam os Espíritos pelos pensamentos.

 A prática regular de as famílias sepultarem os restos mortais de seus entes em um mesmo lugar é útil do ponto de vista material, entretanto, para as leis divinas, essa cultura nenhum valor tem, do ponto de vista moral, a não ser tornar mais concentradas as recordações dos parentes.
 O Espírito que atingiu um determinado grau de perfeição, despojado que se encontra das vaidades terrenas, compreende a inutilidade dos funerais pomposos, que servem mais aos que ficam do que aos que partem.

 Em muitos casos, o Espírito assiste ao seu próprio velório,2 não sendo raras as decepções que experimenta nesses momentos. A simplesmenção do nome do falecido e de outros mortos transforma-se em verdadeira invocação, atraindo- os ao ambiente em que estamos. A propósito, no livro Obreiros da Vida Eterna, ditado pelo Espírito André Luiz ao médium Francisco Cândido Xavier (1910-2002), encontramos significativa advertência:
 – Nossos amigos da esfera carnal são ainda muito ignorantes para o trato com a morte. Ao invés de trazerem pensamentos amigos e reconfortadores, preces de auxílio e vibrações fraternais, atiram aos recém-desencarnados as pedras e os espinhos que deixaram nas estradas percorridas. É por isso que, por enquanto, os mortos que entregam despojos aos solitários necrotérios da indigência são muito mais felizes. [...]

 [...] as câmaras mortuárias não devem ser pontos de referência à vida social, mas recintos consagrados à oração e ao silêncio.
 Qual, então, deve ser a nossa conduta, nessas ocasiões? A mesma postura de respeito que devemos ter para com qualquer pessoa encarnada. Uma prece sincera, um gesto de perdão, um pensamento simples, mas bondoso, endereçado aos entes que partiram, valem mais do que mil coroas de flores e solenidades fúnebres.
 Há uma passagem do Evangelho que bem resume o espírito de finados:

 Segue-me; e o outro respondeu: Senhor, consente que, primeiro, eu vá enterrar meu pai. – Jesus lhe respondeu: Deixa aos mortos o cuidado de enterrar seus mortos; quanto a ti, vai anunciar o Reino de Deus.5
 Que interpretação devemos dar a esse texto? A literal, que nos induz a negar o direito de nos despedir dos nossos entes mais próximos? É claro que não. É que Jesus nunca perdia a oportunidade de ensinar alguma coisa àqueles que o rodeavam. O Mestre falava para o futuro, querendo com isso deixar patente que a morte física é um fato ou fenômeno natural. É o mesmo que dissesse: – Não liguemos à matéria, ao corpo, mais importância do que ele tem.

 Enquanto encarnados, devemos priorizar a vida espiritual em detrimento da vida material, sem, entretanto, descuidar do vaso físico, que constitui a habitação ou o templo do Espírito, instrumento de nosso progresso, considerado o primeiro empréstimo que recebemos do Criador ao reencarnarmos. Portanto, não somos donos, mas meros usufrutuários dele. Como tudo que é material, um dia teremos que devolvê-lo e prestar contas do seu bom ou mau uso.
 O sepultamento dos despojos, além de constituir uma questão de higiene pública, também é uma forma de respeito à personalidade do extinto e aos seus restos mortais, direito contemplado inclusive pelo ordenamento jurídico.

 Sendo a desencarnação a libertação do Espírito da carne, a morte não passa de uma ilusão dos sentidos, porquanto o que morre é o corpo físico. Apenas mudamos de residência, de uma dimensão para outra. Biologicamente, a morte é o esgotamento dos órgãos que, em realidade, também não morrem, mas se transformam, são devolvidos à Natureza por meio da natural desintegração dos seus elementos químicos.
 Seja nossa ou dos outros, devemos aceitar a morte com resignação e coragem, o que é uma prova de confiança no Criador, na certeza da imortalidade. É natural que externemos nossos sentimentos de dor em momentos tão difíceis. Entretanto, evitemos nos entregar ao desequilíbrio, uma vez que essa conduta em nada ajuda o Espírito desencarnante que, nessas circunstâncias, recebe nossos desvarios mentais, com sofreguidão.

 Por derradeiro, não nos esqueçamos de que o mais importante não é o comportamento das pessoas na hora da desencarnação de um ente querido, ou no instante da própria morte física, mas, sobretudo, a conduta que devemos ter durante toda a nossa existência física, pois que, na condição de Espíritos imortais, nossa vida deve ser o resultado de um constante esforço pelo aperfeiçoamento moral.

 Em razão disso, combater os excessos e os maus hábitos físicos e morais é uma boa maneira de nos prepararmos para a morte, com o que faremos jus à mensagem atribuída ao sábio Confúcio: “Quando você nasceu,  todos sorriam, só você chorava. Viva de tal forma que, quando você morrer, todos chorem, só você ria!”.

Referências:

1KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1.reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2011.Q. 329.
2______. ______. Q. 327.
3XAVIER, Francisco C. Obreiros da vida eterna. Pelo Espírito André Luiz. 2. ed. esp. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora,2010. Cap. 14, p. 247-248.
4VIEIRA, Waldo. Conduta espírita. Pelo Espírito André Luiz. 2. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2012. Cap. 36.
5LUCAS, 9:59-60.


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