Estudando o Espiritismo

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domingo, 12 de agosto de 2012

Maledicência


Maledicência é o ato de falar mal das pessoas.  Definição bem amena para um dos maiores flagelos da Humanidade.
Mais terrivel do que uma agressão fisica.  Muito mais do que o corpo, fere a dignidade humana, conspurca reputações, destrói existências.

       Mais insidiosa do que uma epidemia, na forma de boato - eu "ouvi dizer" - alastra-se como rastilho de pólvora.  Mera visão pirotécnica em princípio:
       "Ele paga suas contas com atraso" ou "Ela sai muito de casa".
       Depois, explosiva:
       "Ele é um ladrão!  " ou "Ela está traindo o marido!"

Arma perigosa, está ao alcance de qualquer pessoa, em qualquer idade, e é muito fácil usá-la: basta ter um pouco de maldade no coração.
Tribunal corrupto, nele o réu está, invariavelmente, ausente.  É acusado, julgado e condenado, sem direito de defesa, sem contestação, sem misericórdia.

Tão devastadora e, no entanto, não implica nenhum compromisso para quem a emprega.  Jamais encontraremos o autor de um boato maldoso, de uma "fofoca” comprometedora. O maledicente sempre "vende" o que "comprou".

Ninguém está livre dela, nem mesmo os que se destacam na vida social pela sua capacidade de realização, no setor de suas atividades.  Estes, ao contrário, são os mais visados.  Nada mais gratificante para o maledicente do que mostrar que "fulano não é tão bom como se pensa".

Não há agrupamento humano livre da maledicência. Está presente mesmo onde jamais deveria haver lugar para ela: em instituições inspiradas em ideais religiosos de serviço no campo do Bem.  Quando se manifeste nessas comunidades, infiltrando-se pela invigilância de companheiros desavisados, que se fazem agentes do Mal, é algo profundamente lamentável, provocando o afastamento de muitos servidores dedicados e aniquilando as mais promissoras esperanças de realização espiritual.

       Nem mesmo o Cristo, inspiração suprema desses ideais, esteve livre dela.  Exemplo tipico de seu poder infernal foi o comportamento da multidäo, que reverenciou Jesus na entrada triunfal, em Jerusalém; no entanto, poucos dias depois, instigada pela maledicência dos sacerdotes judeus, festejou sua crucificação, cercando a cruz de impropérios e zombarias.

       A maledicência tem sua origem, sem dúvida, no atraso moral da criatura humana.  Intelectualmente, a Humanidade atingiu culminâncias.  Chegamos à Lua, desintegramos o átomo.  Moralmente, entretanto, somos subdesenvolvidos, quase tão agressivos e inconseqüentes como os habitantes das cavernas, e, se o verniz de civilidade nos impede de usar a clava, usamos a língua, atendendo a propósitos de auto-afirmação, revide, justificação ou pelo simples prazer de atirar pedras ein vidraças alheias.

       Não se dá conta aquele que se compraz em criticar a vida alheia, que a maledicência é um ato de autofagia (condição do animal que se nutre da própria substância, que come o próprio corpo). O maledicente pratica a autofagia moral.  A má palavra, o comentário desairoso contra alguém geram, no autor, um clima de desajuste íntimo, em que ele perde força psíquica e se autodestrói moralmente, envenenando-se com a própria maldade.  Por isso, pessoas que se comprazem nesse tipo de comportamento são sempre inquietas e infelizes.

       Jesus adverte que o maldizente fatalmente será vítima da maledicência, quer porque onde estiver criará ambiente propício à disseminação de seu veneno, quer porque a Vida o situará, inelutavelmente, numa posição que o sujeitará a críticas e comentários desairosos, a fim de que aprenda a respeitar o próximo.

       Deixando bem claro que a ninguém compete o direito de julgar, o Mestre recomenda que, antes de procurarmos ciscos no olho de nosso irrnäo, tratemos de remover a lasca de madeira que repousa, trânqüila, no nosso.  Se possuímos incontáveis defeitos, se há tantas tendências inferiores em nossa personalidade, por que o atrevimento de criticar o comportamento alheio?

       E há os estudos de Psicologia que oferecem uma dimensão bem maior ao ensinamento evangé1ico.  Admitem hoje os psicólogos que tendemos a identificar com facilidade nos outros o que existe em abundância em nós. O mal que vemos em outrem é algo do mal que mora em nosso coração.  Por isso, as pessoas virtuosas, de sentimentos nobres, são incapazes de enxergar maldade no próximo.

       É preciso, portanto, treinar a capacidade de enxergar o que as pessoas teem de bom, para que o Bem cresça em nós. O primeiro passo, dificil mas indispensável, é "minar a maledicência.  Um recurso valioso para isso é usar os três crivos, segundo velha lenda de origem desconhecida, que vários escritores atribuem a Sócrates, lembrada pelo Espírito Irmão X, psicografia de Francisco Cândido Xavier, em mensagem publicada pela revista "Reformador", no mês de junho de 1970:

"Certa feita, um homem esbaforido achegou-se ao grande filósofo e sussurrou-lhe aos ouvidos:
- Escuta, Sócrates... Na condição de teu amigo, tenho alguma coisa de muito grave para dizer-te, em particular...
- Espera!... - ajuntou o sábio, prudente. Já passaste o que me vais dizer pelos três crivos?
- Três crivos? - perguntou o visitante, espantado.
- Sim, meu caro, três crivos.  Observemos se a tua confidência passou por eles. O primeiro é o crivo da verdade.  Guardas absoluta certeza quanto aquilo que me pretendes comunicar?
- Bem - ponderou o interlocutor -, assegurar, mesmo, não posso... Mas, ouvi dizer e...então...
- Exato.  Decerto peneiraste o assunto pelo segundo crivo, o da bondade.  Ainda que não seja real o que julgas saber, será pelo menos bom o que me queres contar?
Hesitando, o homem replicou:
        - Isso não ... Muito pelo contrário...
   - Ah! - tornou o sábio - então recorramos ao terceiro crivo, o da utilidade, e notemos o proveito do que tanto te aflige.
- Útil?!... - aduziu o visitante ainda mais agitado. - útil não é...
-             Bem - rematou o filósofo num sorriso -, se o que me tens a confiar não é verdadeiro, nem bom e nem útil, esqueçamos o problema e não te preocupes com ele, já que de nada valem casos sem qualquer edificação para nós. . . "




Referências bibliográficas:
Richard Simonetti – A voz do monte



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